Agricultura familiar: se já antes fazia sentido, agora ainda mais!

 

A formação profissional ministrada pela CNA e muitas das Associações filiadas desenvolve-se em Candidaturas Integradas de Formação, no âmbito do Eixo Prioritário 2 – Adaptabilidade e Aprendizagem ao Longo da Vida, das Tipologias 2.2 Cursos de Educação e Formação para Adultos e 2.3 – Formações Modulares Certificadas, do POPH – Programa Operacional de Potencial Humano.

 

A CNA – Confederação Nacional da Agricultura – define-se como uma Confederação de organizações de agricultores focando, em particular, os seus princípios e a sua actividade na defesa da Agricultura Familiar. No quadro dos diversos serviços prestados pela CNA, encontra-se a formação profissional, encarada como um importante vector para, também através desta, os agricultores poderem melhorar as suas qualificações e nesta perspectiva, aumentarem a rentabilidade das explorações e melhorarem a sua qualidade de vida.

Considerando que o Mundo Rural precisa dos Agricultores e estes precisam do Mundo Rural, a formação promovida pela CNA tem objectivos mais amplos do que a actividade agro-pecuária e florestal e, alargando-a ao universo do mundo rural, procura abranger os mais diversos temas e actividades que o compõem como, por exemplo, artesanato, fumeiro e enchidos, queijarias, turismo rural, floricultura e jardinagem, silvicultura e caça, protecção do ambiente, entre muitos outros exemplos, não descurando a formação de base (a componente escolar), procurando elevar os índices ainda muito baixos, assim como as ciências informáticas ou a contabilidade e fiscalidade, hoje em dia indispensáveis a qualquer actividade ou exploração agrícola.

O intento é dinamizar actividades que animem e revitalizem o espaço rural, complementando a produção agrícola, pecuária e florestal e, desta forma, travar e inverter a dramática e crescente tendência de despovoamento das zonas rurais e melhorar a qualidade de vida e o rendimento das famílias que resistem e não querem abandonar as suas terras, permitir que com a Agricultura Familiar melhore o auto-abastecimento do país e mesmo que se exportem bons produtos que as condições naturais e climáticas e o saber dos agricultores permitem.

Apesar da boa adesão dos agricultores à formação, Alfredo Campos, da Direcção Nacional da CNA e responsável pelo seu Departamento de Formação Profissional, considera que os números podiam ser mais animadores. E isso porque em seu entender, estruturalmente, a regulamentação continua essencialmente dirigida para a formação de activos por conta de outrem. Sendo genuínas as preocupações de governantes e alguns políticos com o relançamento da produção agrícola e aumento do consumo de produtos agrícolas nacionais, então os regulamentos da formação profissional terão que respeitar e estarem adaptados às especificidades do meio rural e da produção familiar.

Ainda assim, propostas da CNA para facilitar o acesso da Agricultura Familiar a acções formativas foram atendidas e esta já pode fazer as 200 horas de formação (que dão acesso a uma bolsa, essencial para compensar a quebra de rendimento pelo tempo dedicado à formação) de forma descontinuada, adaptando-a aos ritmos e aos ciclos das culturas, assim como a carga horária semanal baixou para um mínimo de 25 horas, o que já permite ter formação e, paralelamente, continuar a fazer alguns trabalhos do campo. Se as propostas da CNA não tivessem sido aceites, seria quase impossível à Agricultura Familiar fazer formação porque teria que abandonar as suas explorações durante cerca de um mês e meio, para cumprir seis horas diárias de formação, durante mais de seis semanas seguidas. 

Mas, para que a formação em meio rural seja mais eficaz, há ainda que ter em consideração, por exemplo, a elevada idade média da população rural, os baixos níveis de escolaridade, a elevada iliteracia, a grande dispersão geográfica das populações, ou as dificuldades de acessos e transportes e adaptar a regulamentação e os conteúdos a esta realidade.

Batalhas por vencer

A nível de regulamentação Alfredo Campos fala numa batalha que falta vencer a nível do Ministério da Agricultura. E passa a explicar: “ainda que o PRODER tenha contemplado a Medida n.º 4.2, «Formação e informação especializada», a mesma não está, no fundamental, a ser feita. Entretanto, a formação de que o agricultor necessita está tipificada no Catálogo Nacional de Qualificações que é o instrumento que certifica, que regulamenta e é suporte pedagógico de toda a formação feita em Portugal, seja em que sector for. E, como o Catálogo é um instrumento dinâmico, em permanente actualização e enriquecimento com novas áreas, consideramos que é no seu universo que a Formação Profissional deve ser promovida e não devem ser mantidos circuitos paralelos, nuns casos sobrepostos e noutros incompatíveis, desperdiçando recursos.

Não obstante, apesar das profissões e das qualificações definidas no Catálogo serem válidas para todas as actividades, o Ministério da Agricultura não se satisfaz com esta certificação nacional e exige certificar o que já está certificado. Por outro lado, insiste em ter a sua própria formação, sem equivalência à do Catálogo, obrigando o formando que pretende progredir na sua qualificação, a fazer duas formações idênticas.

“Insurgimo-nos contra esta prática do MADRP e não pararemos enquanto esta extorsão aos agricultores não acabar”

 Nalgumas áreas como, por exemplo, a aplicação de produtos fitofarmacêuticos, ou a mecanização agrícola, o MADRP exige ainda homologar os conteúdos da formação (já) certificada, assim como exige homologar formadores (já) certificados e chega a impor a utilização, em exclusivo, de instalações suas, de formadores e avaliadores seus funcionários, certamente procurando com este absurdo, o seu próprio autofinanciamento. Assim, apesar deste tipo de formação ser financiada a 100% pelo FSE para todos os cidadãos, nalgumas vertentes, os agricultores, para poderem exercer a sua actividade ou terem acesso a apoios comunitários no âmbito da PAC, são obrigados a pagar para o MADRP.

 
 
 
Que futuro?

A CNA sempre defendeu a Agricultura Familiar e a Soberania Alimentar do país, tal como sempre afirmou que a PAC traria imensas dificuldades à agricultura portuguesa. Desde a entrada para a então CEE, os sucessivos governos, cumprindo os ditames de Bruxelas e, muitas vezes mais papistas que o Papa, produziram legislação nacional ainda mais violenta que os regulamentos da UE. Mesmo sobre os objectivos do PRODER e as propostas da CNA para a sua melhoria, acusaram-nos de estar fora da realidade porque agora (diziam e dizem os governantes, mesmo os actuais), é a época da “competitividade e da internacionalização da agricultura portuguesa”.

Ao longo de todos estes anos em que, pela sua mão, a PAC entrou por Portugal adentro, aceitaram e adoptaram políticas que levaram ao abandono de terras, à redução do número de explorações agrícolas e pecuárias e à baixa da produção agrícola, fazendo com que se importe grande parte do que se consome em Portugal, sem que tal fosse necessário.

Hoje, depois de terem feito o mal que fizeram à Agricultura Familiar e a Portugal, é vulgar ouvi-los falar, com lágrimas de crocodilo, na importância da Agricultura Familiar para reduzir as importações (mas não falam na adopção de políticas dirigidas, apontando apenas para a alteração de hábitos de consumo) e no regresso aos mercados de proximidade, que antes existiam e foram desaparecendo com as suas violentas e segregadoras exigências. Em vez de lamentos e promessas (de velhas receitas) dos que provocaram esta situação, queremos novas políticas que respeitem e impulsionem o Mundo Rural e a Agricultura Familiar.

Produzir cá para Consumir cá”, é um lema que deve mobilizar produtores e consumidores. Outro é, certamente, “Do Produtor ao Consumidor”, sem a ditadura do agro-negócio da indústria e da distribuição que a uns e outros escraviza.

Com outras políticas, a Agricultura Familiar tem futuro e com ela é Portugal que tem futuro.

 Alfredo Campos